15/08/2023

BAÁRBARA MARTINEZ

Houve um tempo em que as drogas eram instrumento apenas para abrir a mente e o coração à liberdade de criar e de amar, sem preconceitos. Bandeira do movimento hippie, isso foi bem antes do mundo aderir ao ritmo acelerado e hiperconectado de hoje. Os jovens da contracultura dos anos 1960 se recusavam a usar terno e gravata e a trabalhar nos moldes comuns, em um escritório. E usavam a psicodelia de substâncias como o LSD para compor a estética do amor livre. Duas décadas mais tarde, uma onda acelerada de mudanças movimentou os Estados Unidos. Eram os yuppies: ambiciosos e bem-sucedidos profissionalmente, jovens movidos à cocaína buscavam na droga uma forma de manter o alto ritmo de trabalho e o igualmente alto padrão de vida. Entre psicodélicos dos anos 1960 e estimulantes dos anos 1980, a onda da vez une um pouquinho desses dois universos tão opostos, e atende pelo nome de microdosagem. Pequenas doses (5% a 10% do uso regular) de LSD, cetamina, cogumelos e outras drogas não legalizadas viraram companhias frequentes no Vale do Silício com o objetivo comum de aumentar a produtividade, o foco e a criatividade. No mundo dos negócios, principalmente, que exige mais e mais de seus funcionários e CEOs, as microdoses reinam absolutas.

Gigantes da tecnologia como Elon Musk e Sergey Brin, cofundador do Google, já assumiram publicamente o uso das substâncias para encarar o dia a dia frenético de startups e empresas globais. Segundo o The Wall Street Journal, os executivos da empresa Founders Fund, conhecida por seus investimentos na SpaceX e no Facebook, até já de- ram festas que incluíam psicodélicos no cardápio. Para Arthur Guerra, psiquiatra e coordenador do Núcleo de Álcool e Drogas do Hospital Sírio Libanês, o consumo realmente provoca efeitos profundos na consciência. “A utilização pode levar à descoberta de novas experiências, revelações ou conexões que a pessoa não possuía antes do uso da substância”, afirma em entrevista à Bazaar. Mas há ainda quem use essas microdoses sem nenhuma pretensão profissional, mas para curar traumas do passado, depressão e ansiedade. O próprio CEO do Twitter e um dos homens mais ricos do mundo, Musk já declarou que toma cetamina em microdoses. Disse publicamente que essa é a melhor maneira de lidar com a depressão em comparação a “antidepressivos amplamente prescritos que estão ‘zumbificando’ as pessoas.”

Mesmo repleto de polêmicas, ele não está totalmente errado. Estudos estão revelando que há vantagens em relação ao uso de outras substâncias, já que as microdoses de psicodélicos possuem mais rapidez no alívio de sintomas de sofrimento mental. No entanto, tais benefícios ainda não foram validados amplamente em estudos científicos, sobretudo em termos de características individuais e doses. “Há casos de indivíduos que apresentaram aumento da pressão san- guínea e de batimentos cardíacos”, ressalta o psiquiatra, que recomenda o uso somente mediante prescrição médica. Alguns especialistas classificam essas drogas como recreativas e, logo, menos prejudiciais, já que, em geral, são raros os casos de overdose fatal ou dependência química quando usadas nesse tipo de tratamento, comenta o doutor Arthur. Embora as empresas do Vale do Silício não tolerem (formalmente) o uso de drogas, muitas não testam os funcionários regularmente. No Brasil, até o momento, a ANVISA proíbe a utilização dessas substâncias como medicamentos, mas legalizar o uso segue em pauta. “Por conta das novas pesquisas, algumas com resultados positivos e muito promissoras, pode ser que daqui a alguns anos o uso seja permitido”, conta o psiquiatra.

Longe dos psicodélicos, os executivos brasileiros já usam há alguns anos outros tipos de drogas para melhorar o desempenho no trabalho. Remédios como Venvanse e Ritalina, usados para tratar o TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade), são febre para jornadas mais longas que demandam foco redobrado. Os remédios só são vendidos com prescrição médica, mas está crescen- do o número de grupos ilegais de venda do produto nas redes sociais. Já existe até o Venvanse natural, em formulação fitoterápica. O mundo está, de fato, mais exigente e acelerado. Mas o bom e velho combo de terapia, sono de qualidade, alimentação saudável e atividade física, além da prática de meditação, dão muito bem conta do recado.

Fonte: https://harpersbazaar.uol.com.br/beleza/drogas-psicodelicas-sao-usadas-por-gigantes-da-tecnologia-como-ferramenta-wellness/